A publicidade sempre exerceu um papel determinante na formação de percepções sociais - além dos aspectos comerciais -, influenciando comportamentos e consolidando estereótipos. Contudo, no atual contexto digital, essa dinâmica se intensificou, uma vez que campanhas segmentadas e personalizadas atingem audiências de maneira ainda mais direta e abrangente. Não obstante, os papéis atribuídos às mulheres na publicidade digital continuam presos a representações ultrapassadas que, muitas vezes, podem reforçar desigualdades e limitar a diversidade de narrativas.

Apesar de as mulheres aparecerem em 88% das campanhas publicitárias, segundo um estudo do movimento SeeHer e da Ipsos, a grande maioria dessas representações ainda está associada a papéis tradicionais.** Elas são mostradas como esposas (30%), mães ou avós (26%), enquanto apenas 2,5% das campanhas as retratam como empresárias e 3,4% como profissionais em áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática**. Esse desequilíbrio não é coincidência, mas um reflexo direto da composição das lideranças no setor publicitário.

De acordo com o relatório “Publicidade Inclusiva: Censo de Diversidade das Agências Brasileiras ODP 2023”, 85% dos cargos de CEO em agências de publicidade ainda são ocupados por homens. Essa falta de representatividade feminina na tomada de decisão impacta diretamente a construção de narrativas e a forma como as mulheres são retratadas na publicidade digital. Sem diversidade nas equipes criativas e nos altos cargos, as campanhas continuam sendo desenvolvidas sob uma perspectiva limitada, perpetuando visões obsoletas do papel da mulher na sociedade.

Para desconstruir esses padrões e ampliar a diversidade de representação, a presença de mais mulheres na liderança da publicidade digital é essencial. Quando elas ocupam espaços de decisão, há uma maior tendência de questionamento sobre estereótipos, além de um compromisso mais forte com narrativas autênticas e inclusivas. Essa mudança também tem impacto direto na segurança de marca (brand safety), pois marcas que adotam uma comunicação mais diversa têm menor risco de crises de imagem e conseguem construir conexões mais autênticas com o público.

Outro aspecto importante é o incentivo ao empreendedorismo feminino no setor publicitário. Com mais mulheres liderando suas próprias agências e startups de marketing digital, surgem novas abordagens para a criação de campanhas mais equitativas. Além disso, empresas lideradas por mulheres têm demonstrado um compromisso maior com a transparência, a ética na comunicação e a inovação em formatos publicitários que desafiam padrões engessados.

O impacto dessa mudança não se limita apenas à forma como as mulheres são retratadas na publicidade, mas também influencia diretamente o comportamento do consumidor. Uma publicidade mais diversa gera maior identificação e conexão emocional, tornando-se mais eficaz na construção de marcas fortes e respeitadas. As audiências modernas exigem autenticidade, e marcas que perpetuam estereótipos estão cada vez mais sujeitas a críticas e boicotes.

A influência da liderança feminina também se reflete na abordagem criativa das campanhas. Profissionais mulheres trazem perspectivas diferenciadas, contribuindo para a criação de narrativas mais ricas e inclusivas. Isso se traduz em campanhas que abordam questões sociais relevantes, desafiam padrões estabelecidos e criam espaço para novas vozes e histórias serem contadas.

O papel da liderança feminina na publicidade digital também está relacionado à implementação de políticas internas mais inclusivas dentro das empresas do setor. Agências que possuem mulheres em cargos de liderança tendem a promover ambientes de trabalho mais equitativos, incentivar a diversidade nas equipes e criar programas de mentorias para novas profissionais. Essa cultura organizacional mais inclusiva fortalece o setor como um todo, permitindo que diferentes pontos de vista sejam considerados na elaboração de campanhas publicitárias.

Por isso, é fundamental que as empresas do setor publicitário invistam em programas de diversidade e inclusão para incentivar a ascensão de mais mulheres a cargos de liderança. Isso inclui a implementação de políticas salariais equitativas, iniciativas para promover o equilíbrio entre vida profissional e pessoal e programas de desenvolvimento de liderança feminina.

A publicidade digital tem um grande poder de influência e moldagem da sociedade. Para que essa influência seja positiva e representativa, é fundamental que mais mulheres ocupem espaços de liderança no setor. Somente com uma maior diversidade de vozes na criação e direção de campanhas será possível romper com estereótipos e garantir uma publicidade mais autêntica, inclusiva e alinhada às reais complexidades da sociedade contemporânea. A liderança feminina na publicidade digital é, portanto, não apenas uma questão de justiça social, mas também uma estratégia de negócios essencial para a relevância e sucesso das marcas no futuro.

(Conforme publicado em Mundo do Marketing)