Por Lorenzo Nicodemo, Head of Publisher Acquisition (Latam e Brasil) da MGID.

No atual cenário do setor de publicidade digital, a discussão sobre “brand safety” (segurança de marca, em tradução livre) tem ganhado destaque, especialmente diante do crescimento de sites “feitos para publicidade” (do inglês ‘made for advertising”, ou MFA) e do conteúdo gerado por inteligência artificial (IA). Debatem-se as responsabilidades das plataformas de publicidade sobre o controle dos conteúdos passíveis de monetização, em contraste com a visão de que essas decisões poderiam ser orientadas pelas dinâmicas de mercado, o que coloca anunciantes e publishers diante da escolha entre uma regulamentação voltada à segurança de marca absoluta ou a permissão para que a oferta e a demanda definam o que é aceitável e seguro.

Embora o foco recente no tema esteja associado aos sites MFA, a trajetória dos veículos de comunicação sempre esteve vinculada à dependência da publicidade, incluindo períodos em que páginas inteiras de jornais impressos compunham a base essencial de receita. No contexto digital, especialmente para pequenos publishers sem fontes adicionais de lucro, essa prática resultou no surgimento dos sites “feitos para publicidade” – definição que tem se ampliado cada vez mais e, muitas vezes, abrange desde sites com pouca ou nenhuma produção editorial e curadoria de conteúdo até portais maiores que, sobretudo em momentos de maior desafio financeiro, contam muito com este tipo de receita.

Em um mercado com margens reduzidas, essa prática reflete uma escolha por sobrevivência e segurança financeira. Da mesma forma que uma pequena empresa opta por vender produtos de menor margem, um editor de conteúdo depende de cada visualização de múltiplos anúncios para sustentar sua operação. Por isso, a aplicação de controles automatizados contra esses sites pode inviabilizar a permanência de publishers legítimos ao limitar suas oportunidades de crescimento e refinamento de estratégias.

O uso de IA generativa para produção de conteúdo é outro ponto central no debate sobre segurança de marca. Embora existam preocupações sobre essa nova dinâmica, o engajamento com conteúdos gerados por IA, desde que sejam confiáveis, é autêntico e, portanto, monetizável. O valor publicitário reside na interação genuína com o conteúdo.

Para anunciantes que priorizam ambientes controlados e de alta qualidade, as estratégias de posicionamento podem incluir marketplaces ou acordos diretos com publishers específicos. Entretanto, na publicidade programática aberta, excluir conteúdos automatizados – que não apresentem fraude ou ameaça à segurança de marca – pode limitar desnecessariamente o alcance. Dessa forma, ao barrar sites que utilizam IA para atrair audiência, as plataformas podem restringir o potencial alcance dos anunciantes.

Um exemplo dos desafios de controle de brand safety pode ser observado na plataforma X (antigo Twitter). Sob a administração de Elon Musk, com uma abordagem ampla de liberdade de expressão, a moderação de conteúdo foi reduzida, permitindo a disseminação de notícias não validadas e conteúdos potencialmente danosos. Essa postura levou ao afastamento de anunciantes e até de países inteiros, como o Brasil.

Outras plataformas, como Facebook, YouTube e Spotify também enfrentaram desafios ao equilibrar liberdade de expressão com segurança de marca. No Facebook, conteúdos de discurso de ódio e desinformação levaram grandes marcas a suspender anúncios. O YouTube, em 2017, sofreu uma crise quando anúncios apareceram ao lado de conteúdos extremistas, provocando a retirada de publicidade por empresas. Já no Spotify, conteúdos polêmicos em podcasts geraram boicotes e levaram a empresa a adotar rótulos de aviso.

Esses casos ilustram o dilema entre criar ambientes seguros para anunciantes e preservar a diversidade de conteúdos. Por isso, as plataformas de publicidade devem garantir uma segurança mínima, bloqueando as atividades claramente ilícitas. Qualquer ampliação desse escopo, visando definir o que é aceitável para cada anunciante, tende a ignorar as variações de interesse dentro do mercado.

Ou seja, a segurança de marca depende de um equilíbrio entre controle e liberdade. Uma abordagem excessivamente restritiva pode limitar as opções dos publishers, enquanto a falta de controle pode fazer com que anunciantes e usuários migrem para ambientes mais seguros. Observa-se, assim, que o papel das plataformas de publicidade é intermediar oferta e demanda, excluindo, obviamente, atividades criminosas. Já a escolha sobre a adequação de cada posicionamento cabe, em última instância, aos anunciantes, de forma que o próprio mercado possa definir os parâmetros de segurança e qualidade que considera aceitáveis.

(Conforme publicado em Economia SP)